sábado, 5 de janeiro de 2013

o que o dinheiro não compra

            Há quem veja na animosidade de nossa política um excesso de convicção moral: são muitos aqueles que acreditam demais, de maneira demasiada agressiva, nas próprias convicções, querendo impô-las aos outros. Tenho pra mim que se trata de uma leitura equivocada do transe em que nos encontramos. o problema na nossa política não é uma questão de convicções morais de mais, mas de menos. Nossa política é tão exaltada por causa do seu essencial vazio, em conteúdo moral ou espiritual. Ela não é capaz de enfrentar as grandes questões que importam a todos.
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           À sua maneira, o pensamento mercadológico também priva a vida pública de fundo moral. O interesse do mercado decorre em parte do fato de não julgar as preferências a que atende. Ele não quer saber se determinadas maneiras de avaliar os bens são preferíveis a outras ou mais condignas. se alguém estiver disposto a pagar por sexo ou por um rim e um adulto se dispuser a vendê-lo, a única pergunta que o economista faz é: "Quanto?" Os mercados não apontam o polegar para cima ou para baixo. Não discriminam entre preferências louváveis ou condenáveis. Cada parte envolvida num trato decide por si mesma que valor atribuir aos objetos trocados.
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          Um debate sobre o limite moral do mercado nos permitiria decidir, como sociedade, em que circunstâncias os mercados atendem ao bem público e quais aquelas em que eles são intrusos. Também contribuiria para revigorar a política a abrir espaço para ideais concorrentes na arena pública. Pois de que outra maneira poderia ter curso esse tipo de debate?
          Caso você concorde que a compra e a venda de certos bens os corrompem ou degradam, será forçosamente porque acredita que certas maneiras de lhes atribuir valor são mais adequadas do que outras. Não faria sentido falar de corrupção de determinada atividade - a criação de filhos, por exemplo, ou a cidadania - se não acreditarmos que certas maneiras de ser pai ou um cidadão são melhores do que outas.
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          Mas o desafio moral e político que hoje enfrentamos é mais capilarizado e mais prosaico: repensar o papel e o alcance do marcado em nossa práticas sociais, nas relações humanas e na vida cotidiana.

Sandel, Michael J. - O que o dinheiro não compra "os limite morais do mercado"

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